domingo, 5 de novembro de 2017

O Grande Espetáculo

.............Esta crônica trata sobre a Rua da Minha Infância, a TIRADENTES (SARANDI - RS). Meu filho menor (PEDRO FREDERICO) comprou um cão pequeno, branco. Parece um porquinho. Este canino tem uma importante missão. Diariamente, ele me procura e fica me olhando. Pergunto: "Tu qué brincá cumigo?" Nós brincamos um pouco. E, logo, sigo meu caminho ... Quando eu era pequeno, ao perceber que o meu Pai se aproximava, eu perguntava: "Tu qué brincá cumigo?" Ele queria. Quase sempre podia ... Com certeza, o Pai (FRIDOLINO) sabia da importância da convivência com os filhos.


.............Nasci na subida da Rua TIRADENTES, próximo à Igreja Matriz N S DE LOURDES, numa casa de madeira amarela. Aos 3 anos de idade, fui morar na esquina da Av 7 de Setembro com a Rua TIRADENTES. A avenida era uma das mais importantes da Cidade. Mas, por ser uma subida, permitia poucas atividades. A Rua TIRADENTES era plana e favorável a trabalhos e brincadeiras diversas.

.............Nos primeiros anos, a Rua, para o lado NORDESTE, era uma trilha, cercada de capoeira. O jardim da Dona ELVIRA e o da Mãe (JOVILDE) atraiam centenas de borboletas. O pomar, construido pelo vizinho (PEDRO PICCINI) era visitado por pássaros belíssimos: saira azul, saira sete cores ... Nas noites de verão, poucos guris tinham coragem de percorrer a TIRADENTES. É impossível esquecer a festa dos vagalumes. Não havia, ainda, iluminação pública. A noite era um grande mistério. A sinfonia dos grilos e sapos dava medo. O céu mostrava todas suas estrelas.
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         O meu pequeno SARANDI, construido próximo ao divisor das águas do RIO DA VÁRZEA e do RIO PASSO FUNDO, era uma espécie de "Norte Selvagem". As estradas eram precárias. Os viajantes sofriam como animais. Os ônibus que passavam na Rua TIRADENTES, oriundos do OESTE do PARANÁ e de SANTA CATARINA, apresentavam sujeira de todos os tipos (pó, lama, vômitos ...). Quando os passageiros do "ÁGUIA BRANCA" eram cumprimentados, na Estação, levantava poeira ...
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Eu gostava de jogar bola na calçada. Às vezes, com os amigos, às vezes, com o Pai. Este usava um boné, suspensório, sapato preto. Tudo muito simples. Ele chutava com o peito do pé esquerdo. Gostava de cabecear a bola. Quando eu menos esperava, ele aparecia. Que saudade! 
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Nas chuvas de verão, a Rua TIRADENTES era um ponto de encontro. Eu sabia que era "perigoso" tomar banho de chuva. Eu só ía se a Mãe autorizasse. Quando ela me autorizava, eu ía para a chuva sem medo. Só eu sei o valor da minha mãe. Ela tinha pouco estudo, mas tinha fé, intuição e empatia. Quando eu fazia aniversário, ela sempre me dava algum presentinho. Pequenos brinquedos. Cavalinhos de plástico coloridos ...
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No campo emocional, a Rua TIRADENTES era um palco, um caminho. Por ela, eu subia para ir à aula, para ir à Missa, para me confessar ... Descia, alegre, para ir caçar nos potreiros, nadar na "Curva", pescar no Rio BONITO. Tinha tempo de sobra para procurar uma boa forquilha e pedras de rio para o meu inseparável bodoque.
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Ao abrir as caixas de brinquedos, vindos do PORTO ALEGRE, junto com meu Pai, eu ficava surpreso, maravilhado ... Não tem como esquecer! O homem precisa de tão pouco para ser feliz! Um gesto, um brinquedo, um perdão!
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A Rua da Minha Infância, volta e meia, era tomada pela tristeza: alguns pais de família, alcoolizados, não conseguiam mais voltar para suas casas. Viviam uma lenta agonia. Morriam um pouco a cada dia. Para o desespero de suas dedicadas esposas. Graças a DEUS, em minha casa, bebida alcoólica não entra!
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A reforma do CINE GUARANY marcou a nossa infância. O Sr DÂNDALO, principal acionista do Cinema, mandou instalar pastilhas nas paredes. Os guris faziam coleção. Algumas nós ganhávamos. Outras nós "tirávamos". O Sr DÂNDALO, sorridente, fazia de conta que não via nada. Grande alma!
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Nossa imaginação não tinha limites: com madeira fazíamos armas, ônibus, pequenos caminhões, gaiolas, carrinhos de lomba ... Com barro, bonecos, autinhos, pequenos rios ... Quando jogava bolitas na terra, nem subia para o almoço.
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A minha família passou por, pelo menos, dois grandes sustos. Quando eu andava de bicicleta (MONARK aro 26), a correia cortou o dedão do meu pé direito. O Sr CLAUDIO FERRONATO me levou ao Hospital, de caminhão. Quando a minha irmã (LORENA) caiu da escada, no fundo da casa, o Pai levou-a nos braços, correndo, até o Hospital.
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Na década de 60, fiquei entusiasmado com a candidatura do IVO SPRANDEL à Prefeitura. Escrevi o nome dele nos muros da Rua TIRADENTES.
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Situada na Rua da Minha Infância, a Estação Rodoviária foi palco de tantas partidas e tantas chegadas. Não raro, com lágrimas nos olhos ... Na TIRADENTES, morou, também, a minha primeira namorada ...
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Aconteceram, naquela época, vários fatos pitorescos. Numa tarde de verão, apareceu um rato grande no meio da Rua. O Pai e o Sr LINO HAHN estavam descarregando um caminhão da Transportadora AURORA. O Pai disse: "LINO, olha o rato!" E o LINO disse: "FRIDOLINO, olha o rato!" E o bicho passou ao lado deles e entre os pés deles .... Não conseguiram pegar o rato. Este voltou ileso para o sistema de esgoto. Mas engraçada e perigosa foi a fuga de um porco. Este seria carneado no terreno de cima, do Sr VITÓRIO PICCINI. Vários guris corriam atrás do porco. Este fugia para o lado da Rodoviária. Decidi ajudar. Quando o porco deu uma travada, na calçada do Cinema, eu me atirei nele. Segurei-o, com as duas mãos. Houve um certo risco. O vizinho foi mordido no braço, perto da veia!
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Na Rua TIRADENTES, a CASA SANTO ANTÔNIO funcionou durante 31 anos.Tudo dava certo. A casa do meu Pai era abençoada por DEUS.
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Mas, afinal de contas, qual foi o espetáculo da Rua da Minha Infância? Quem deixou tanta saudade assim?
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Jogar bola nas calçadas da Cidade ou nos gramados do RIO GRANDE. .. com o meu Pai. .. foi o grande espetáculo!
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Querido jovem! Não deixe teu Pai tomando chimarrão sozinho! Não deixe ele brincando sozinho! Não deixe teu Pai jogando bola sozinho! Ele vai deixar saudade ... O Pai é o grande espetáculo!

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