LIÇÕES DO PASSADO
.........Bom dia, Amigo Leitor! Com objetivo de conhecermos ou recordarmos o vocabulário empregado nos séculos passados, apresentarei uma poesia bela e de grande importância social. Ela é rica em palavras empregadas pelo homem do campo. Sem conhecê-las, não é possível entender a profunda mensagem do Poeta! São mais de 30 vocábulos que deixam o Leitor em dúvida! O Autor, um Gênio da Cultura Gaúcha, interpretou o sentimento dos trabalhadores. Bradou um “grito de alerta”! Como é possível uma Nação tão rica em Recursos Humanos abandonar o homem do campo? Como é possível um Brasil tão rico em recursos naturais deixar os idosos desassistidos? Repletos de virtudes e habilidades, mas desassistidos! O tema ainda é atual! Nas décadas passadas, a distribuição da renda não era a ideal. E hoje?
.........Após a emocionante poesia, apresentarei o significado de algumas palavras. Quando Eu era jovem, sabia de cor! É o meu incentivo aos declamadores de hoje. Vamos manter viva a Cultura Gaúcha! Vamos alertar os líderes! Vamos continuar crescendo juntos! Desejo leitura prazerosa. C F VOGT
TIO ANASTÁCIO
Entre a Ponte e o Lajeado
Na venda do Bonifácio
Conheci o tio Anastácio
Negro velho já tordilho;
Diz que mui quebra em potrilho,
Hoje, pobre e despilchado,
De tirador remendado
Num bolicho de campanha
Golpeando um trago de canha
Oitavado no balcão,
Tinha bem logo a impressão
Que aquele mulato sério
Era o Rio Grande gaudério
Tinha lhe dado uma estafa,
E aquela meia garrafa
Dentro do cano da bota
Contava a história remota
Do negro velho curtido
Que os anos tinham vencido
Sem diminuir na derrota!
Nos tempos da escravatura,
Aquela estranha figura
Na vida passara tudo;
Ginetaço macanudo
Já desde o primeiro berro
Saía trançando “ferro”
Com toda a calma e perícia!
Reservado e sem malícia,
Negro de toda a confiança,
Benquisto na vizinhança,
Dava gosto num rodeio,
De pingo alçado no freio
Pialando de toda a trança.
Da Argentina e do Uruguai;
Andara no Paraguai,
Peleando valentemente,
E voltara humildemente
Como tantos índios tacos
Que foram vingar nos Chacos
A honra da nossa gente!
Caboclo de qualidade
Que não corpeava uma ajuda,
Na encrenca mais peleaguda
Sempre conservava o tino,
Garrucha boca de sino
Carregada com amor
E um facão mais cortador
Do que aspa de boi brasino!
Foram ficando à distância,
Andou de estância em estância
E foi vivendo de changa;
Repontando bois de canga
Castrando com muita sorta,
E em tempos de seca forte
Arrastando água da sanga...
Que se encontra nos galpões
E ao derredor dos fogões
Fala aos moços com paciência
Do que aprendeu na existência,
Ao longo dos corredores,
Alegrias, dissabores,
Curtidos pela experiência!
Tio Anastácio p’ra lá...
Mandando mesmo que piá
Por aquela redondeza;
Nos remendos da pobreza,
Entrava e passava inverno,
Como um tronco, só no cerno,
Pelegueando a natureza!
Só se alegrava bebendo,
Como se cada remendo
Da velha roupa gaudéria
Fosse uma sangria séria
Por onde o sangue do pago
Se esvaísse, trago a trago,
Por ver tamanha miséria!
-Negro velho de valor!-
Morreste no corredor
Como matungo sem dono;
Não tendo nesse abandono
Ao menos um companheiro
Que te estendesse o baixeiro
Para o derradeiro sono!
Na Estância grande do Céu
Engraxando algum sovéu
P’ra o Patrão velho buenacho,
Não te esquece aqui de baixo
Onde a “lo largo” inda existe
Muito xiru velho triste
Como tu, criado guacho!
JAYME CAETANO BRAUN
VOCABULÁRIO:
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1 – Lajeado: nome próprio (vila, arroio, local...).
1 – Lajeado: nome próprio (vila, arroio, local...).
2 – tordilho: cavalo, cujo pêlo lembra a plumagem do pássaro tordo (fundo geral branco encardido, salpicado de pequenas pintas escuras).
3 – potrilho: cavalo que ainda está no período de amamentação (no máximo até dois anos de idade).
4 – despilchado: aquele que não tem pilchas, mal-vestido, pobre, sem dinheiro...
5 – tirador: espécie de avental de couro curtido, macio, usado pelos laçadores, durante as lidas, para proteger a roupa e o corpo do atrito do laço.
6 – petiço: cavalo bem pequeno, baixo, de pernas curtas (Não é raquítico!).
7 – douradilho (doradilho): cavalo ou muar (mula) de pêlo avermelhado, com reflexos dourados, quando exposto ao sol.
8 – bolicho: pequeno estabelecimento comercial, bar, bodega, venda...
9 – golpear um trago...: golpear, trago, gole.
10 – canha: aguardente, cana, cachaça...
11 – oitavado: de lado, de esquelha, de soslaio.
12 – mulato: descendente de negro, mestiço de negro com branco.
13 – changa: serviço avulso, carreto, biscate. Trabalho de pouca duração e importância.
14 – corredor: estrada entre dois campos, separados por cercas de um lado e de outro. Indivíduo que monta o cavalo nas corridas.
15 – matungo: cavalo velho, ruim, sem préstimo, mancarrão, sotreta, pilungo...
16 – baixeiro: manta de lã que se coloca sobre o lombo do animal, por baixo da carona, quando se encilha.
17 - sovéu: laço grosseiro e forte, feito com duas ou três tiras de couro torcidas, utilizado para pegar touros.
18 – xiru (chiru): moreno carregado, índio, caboclo. Do Tupi: meu companheiro.
19 – gaudério: indivíduo que viaja muito, despreocupado, bem de vida, querido por todos, folgazão, divertido.
20 – tropilha: porção de cavalos (dez a vinte) do mesmo pêlo e que seguem uma égua-madrinha. Tropilha de baios. Bando, grupo.
21 – guaxo: animal ou pessoa criada sem mãe ou sem leite materno. Sem arrimo, abandonado.
22 – ginetaço: superlativo de ginete. Ginete que cavalga bem e com garbo.
23 – ginete: bom cavaleiro, que monta bem, com firmeza e garbo.
24 – macanudo: muito bom, excelente, notável, superior, rico, respeitável.
25 – potro: cavalo ainda não domado ou iniciando o processo de domesticação.
26 – colhudo – cavalo não castrado, inteiro, pastor.
27 – alçar: levantar as rédeas. Fazer com que o cavalo levante a cabeça por meio das rédeas.
28 – pialar (pealar): laçar o animal pelas patas dianteiras, quando este vai correndo em alta velocidade, derrubando-o.
29 – trança: maneira de tratar os tentos, o cabelo, a crina... produzindo artefatos entrelaçados.
30 – taco: indivíduo hábil,capaz, jeitoso, perito. E nérgico, corajoso, guapo...
31 – peleaguda: que ameaça ter sérias consequências, arriscado, perigoso.
32 – garrucha: china velha. Pistola boca de sino, bacamarte.
33 – brasino: da cor da brasa (cavalo, gato...).
34 – pelego: pele de ovelha ou de carneiro, ainda com a lã, que serve de forro ao assento dos arreios.
35 – peleguear: bater com o pelego.
(DICIONÁRIO GAÚCHO BRASILEIRO - BATISTA BOSSLE)
(DICIONÁRIO GAÚCHO BRASILEIRO - BATISTA BOSSLE)
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